COMENTÁRIO DE SANTO TOMÁS DE AQUINO AOS NOMES DIVINOS DE PSUDO-DIONÍSIO AREOPAGITA
(DE DIVINIS NOMINIBUS)

PROÊMIO

Para a compreensão dos livros do bem-aventurado Dionísio, deve-se considerar que as coisas que estão contidas nas sagradas escrituras a respeito de Deus dividem-se habilmente em quatro partes.

Pois em certo livro, que não existe entre nós, intitulado De Divinis Hypotyposibus isto é, sobre as características (characteribus) divinas, ele trata daquelas coisas concernentes a Deus que dizem respeito à unidade da essência divina e à distinção das pessoas. Mas este mistério excede toda faculdade da razão natural, e portanto nenhuma semelhança da unidade e distinção é suficientemente encontrada nas criaturas.

Porém, pode-se considerar de duas maneiras, aquelas coisas cuja semelhança é encontrada nas criaturas. Primeiro, de acordo com uma semelhança derivada de Deus nas criaturas; assim desde o primeiro bem são todas as coisas boas e desde a primeira vida são todas as coisas vivas e, portanto, outras coisas semelhantes. E tais coisas Dionísio trata minuciosamente no livro Sobre os Nomes Divinos, que temos em mãos.

Em segundo lugar, de acordo com uma semelhança transferida das criaturas para Deus; como por exemplo, quando Deus é chamado de leão, pedra, Sol ou algo parecido; pois deste modo Deus é nomedo simbolicamente e metaforicamente. Dionísio trata dsete tema em seu livro De Symbolica Theologia.

Mas como toda semelhança de uma criatura com Deus é deficiente e Deus excede tudo o que é encontrado nas criaturas, o que conhecemos deve ser removido de Deus, assim como é nas criaturas. E assim, após nosso intelecto, guiado pela mão das criaturas, conceber tudo que pode sobre Deus, este mesmo Deus ainda permanecerá desconhecido e oculto. Pois Deus não é como a pedra e o Sol que são apreendidos pelos sentidos, ou como a vida ou a essência que pode ser concebida por nosso intelecto. Deste modo, Deus, uma vez que excede tudo o que apreendemos, permanece desconhecido para nós. No entanto, a respeito deste afastamentos pelo qual Deus permanece desconhecido e escondido para nós, Dionísio, trata em outra obra que intitulou De Mystica Theologia.

No entanto, deve-se considerar que o bem-aventurado Dionísio usou um estilo obscuro em todos os seus livros, o que, de fato, ele não o fez por inexperiência, mas por diligência, a fim de esconder os dogmas sagrados e divinos do escárnio dos infiéis.

Dificuldades também acontecem nos livros citados, por muitas causas.

Em primeiro lugar, porque Dionísio utiliza o estilo e o modo de falar dos platônicos, os quais os homens modernos não estão acostumados. Pois os platônicos, desejando reduzir as coisas compostas ou materiais a princípios simples e abstratos, postularam espécies separadas das coisas, afirmando que o homem, assim como outras espécies de coisas naturais estão além da matéria. Disseram, portanto, que esse homem singular sensível não é o próprio homem, mas se chama homem pela participação daquele homem separado. Donde se encontra neste homem sensível algo que não pertence à espécie da humanidade, a saber, a matéria individual e outras coisas deste tipo. Pois no homem separado não há senão aquilo que pertence à espécie da humanidade. De onde chamaram o homem separado de homem per se, porque este não tem nada além daquilo que pertence à humanidade; isto vale principalmente para o homem, na medida em que a humanidade é derivada para os homens sensíveis através do homem separado por meio de participação. Assim também pode-se dizer que o homem separado está acima dos homens e que o homem separado é a humanidade de todos os homens sensíveis, visto que a natureza humana se aplica puramente ao homem separado e dele deriva para os homens sensíveis.

E não apenas com esse tipo de abstração os platônicos consideravam as espécies últimas das coisas naturais, mas também sobre as coisas mais comuns, que são o bem, o uno e e o ente.

Pois eles postularam um primeiro que é a própria essência da bondade e da unidade e do ser, que chamamos de Deus, e que todas as outras coisas são chamadas boas ou unas ou entes por derivação daquele primeiro. Assim, o chamaram de bem em si ou bem per se, bem principal ou supra-bem, a bondade de todas as coisas boas ou mesmo a bondade, e a essência ou substância; do mesmo modo que foi exposto sobre o homem separado.

Esta opinião dos platônicos, portanto, não concorda com a fé e nem com a verdade, no que diz respeito ao que ela contém sobre as espécies naturais separadas. Mas no que diz respeito ao que disseram sobre o primeiro princípio das coisas, sua opinião é muito verdadeira e consoante com a fé cristã.

De onde Dionísio nomeia Deus às vezes como a própria bondade ou bem principal ou a bondade de todas as coisa boas. E da mesma forma o nomeia supervida, supersubstância ou a própria divindade teárquica, isto é, a divindade principal, porque mesmo em certas criaturas, o nome de divindade é de acordo com certa participação.

Já a segunda dificuldade acontece em suas falas, porque geralmente usa argumentos eficazes para mostrar uma proposição, e muitas vezes os insinua com poucas palavras ou mesmo com uma palavra.

Em terceiro lugar, porque muitas vezes ele usa certa multiplicação de palavras que, embora possa parecer supérflua, no entanto, para quem considera diligentemente, descobre-se uma grande profundidade de conhecimento.

Tradução: Geovane Campanher

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